quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Não vou ligar

Esse texto partiu de um processo de escrita livre, a catarse de uma situação pessoal na forma de uma história. Não sei o porquê, mas algumas vezes esse processo gera uma personagem feminina. Talvez alguém que saiba de psicologia possa dar uma explicação, mas eu só aceitei, porque não sei mesmo, e está tudo bem. É um texto bruto, pouquíssimo lapidado, mas eu quero compartilhá-lo como está e nem por isso quero que me poupem de suas sugestões sobre como lapidá-lo ou não.

Espero que gostem. Boa leitura!

*

Chego em casa toda molhada da chuva. Chamo pelos meninos com quem divido o apartamento, mas eles devem ter saído. Vou para o quarto, deixo a bolsa, o casaco, e vou para a cozinha fazer um chá. As minhas amigas reclamam que eu coloco muito açúcar no chá, mas eu prefiro. De amarga basta a vida.

Volto para o quarto, ponho a caneca com o chá quente em cima da mesa. Abro o computador: facebook. Pedidos de amizade: nenhum. Mensagens: nenhuma. Atualizações: convites para o CandyCrush, eventos que não me interessam, comentários no meu último post… Polêmica. Ai, cara, não tô afim… Abro o e-mail: propagandas, listas da faculdade, mais nada. Nada dele. De volta ao face, vamos à polêmica.

A resposta que eu dei não faz o menor sentido, mas vai me render uns likes. Eu tô precisando de uns likes, só Deus sabe. Quem tá online? Tem gente que não falo há muito tempo. Uma ou duas amigas. Um amigo. Mais nada - nada dele. O amigo puxa a conversa:
   - Iaí, Vanda, tudo bem? - gente boa pra caralho, o Cláudio.
   - Tudo sim! - eu minto - E você?

A conversa chega a dar pena. Ele parece estar animado, mas eu só respondo monossílabos, frases prontas… Como a gente consegue ser cruel com a gente mesmo, né? A gente engana os outros pra se convencer de que nada precisa mudar.

Olho o whatzap - fazem cinco minutos que não vejo, vai que? - e até agora nada. Nada dele. Talvez ele esteja olhando o whatsapp e pensando a mesma coisa. Não sei o porquê, mas isso me conforta, saber que ele também está sofrendo.

Desligo o computador - está tarde pra assistir alguma série - e vou deitar. Pego um livro e começo a ler. Penso nele, balanço a cabeça - não vou ligar. Deixo o livro de lado, me ajeito na cama e fico olhando para o teto, dizendo para mim mesma: não vou ligar, não vou ligar, não…

Pra quê isso? Diz pra mim! A gente teve uma puta conversa madura, falamos das nossas metas, dos nossos objetivos e chegamos à conclusão de que não dá. Eu já sabia, e ele também, mas teve de chegar a esse ponto da gente não poder negar que não dá. Racionalmente não dá. A gente se ama, e daí? Eu consigo amar outra pessoa, se quiser. Amor é coisa que se constrói.

Mas e se não? Se ele for o meu último amor? Tenho certeza que vou encontrar uma pessoa que tenha um projeto de vida mais compatível com o meu, e talvez ele seja até mais bonito, mas será que eu vou amá-lo? E se eu amá-lo, só que menos? E se eu amá-lo mais? É claro que não vou amá-lo mais. Não vou ligar.

"Eu te quero de volta, Pedro. Foda-se os projetos de vida. Foda-se o dinheiro, a profissão, as crenças… Volta pra mim, pelo amor de Deus." Não! Apago a mensagem antes de enviar. Atiro longe o celular. Não vou ligar. Você não entendeu ainda, Vanda? Eu não vou ligar! Quer chorar, chora, mas eu não vou ligar.

Merda. Estou chorando. Que puta vontade de ligar pra minha mãe. Que puta vergonha de ter vontade de ligar pra minha mãe. Eu sou uma mulher, não uma menina. Eu aguento. Eu não vou ligar.

O telefone toca. Eu levanto da cama como uma desesperada e pego o celular despedaçado no chão - está quebrado, é o fixo mesmo. Vou até a sala e pego o telefone.
   - Alo?
   - Alo…
   - Pedro, é você?
   - Sim.
   - …
   - Eu queria te dizer...
   - O quê?
   - Que eu tô na maior merda.
   Ai, que bom!
   - Eu também, Pedro…
   - Nossa… Não sei o porquê, mas eu me sinto bem em saber disso.
   - Eu também - risos.
   - Pois é. Você tem certeza disso? Não tem jeito mesmo?
   - Tenho sim.
   - …
   - Você?
   - Eu também.
   - Mas não é fácil, né?
   - Não é não.
   - Bem, eu ainda te amo.
   - Eu também... Boa noite, Vanda.
   - Boa noite, Pedro.
   - Dá um beijo na sua mãe. Ela é foda, eu gosto muito dela.
   - Ah, sim, pode deixar - risos.
   - Tchau.
   - Tchau.

Desligo o telefone. Volto para o quarto. Deito na cama. Choro que nem uma desgraçada no fim do mundo. E durmo. Durmo como uma criança mimada.

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